O
trabalho de Ratie
-
Antonio Caetano –
Bem
no fundo, lá embaixo, nos esgotos da cidade grande, onde as sombras eram as
mais assombrosas, e onde os passos nunca eram ouvidos, Ratie, o rato, estava em
sua toca, chorando. Triste por causa da bronca que o tio lhe dera.
- Ratie, seu ratinho
estúpido! Não suba para fora do esgoto sozinho! E não fale com outros animais
que não sejam seus irmãos ratos!
Ratie ajudara uma
corujinha perdida no esgoto a achar a saída.
- Agora aquela
corujinha vai crescer e vai caçar nossos irmãos à noite! Justo quando os
humanos estão dormindo e ficamos mais seguros! Você só atrapalha!
Por isso Ratie ficou
bem quieto no seu buraco. Não pensara no perigo que correra na superfície ou no
mal que tinha feito a seus irmãos. Ele só queria ajudar a corujinha perdida. Ser
um bom animal!
Um belo dia, ou uma
bela noite, não se sabia, afinal nos esgotos parece ser sempre noite, Ratie
resolveu ir embora. Mas não podia ir sozinho na superfície! Iria, então, para
mais fundo, para um lugar onde nenhum outro rato tinha ido.
O Poço Profundo.
Perto do poço ouviu um
barulho. Mais rápido que um piscar de olhos Ratie encontrou uma fenda para se
esconder e esperou lá, em silêncio. Viu então se aproximar uma borboleta. Voando
desengonçada, subindo e descendo, como as borboletas fazem. Ratie se perguntou
o que uma borboleta fazia tão fundo no esgoto. Então ela voou para dentro do
Poço Profundo.
Bom, pensou Ratie, se
uma borboleta que é tão pequenininha e frágil pode ir ao poço, então eu também
posso. O Poço Profundo era um cano feio e enferrujado, que descia por um buraco
escuro e assustador.
Ratie respirou fundo e
se jogou.
Caiu por tanto tempo
que até pensou porque continuava caindo. Seu coraçãozinho batia mais acelerado
que o normal. Até que viu lá no fundo uma luz muito forte e caiu num lago de
água cristalina.
Quando nadou para a
superfície ficou de boca aberta. Estava em uma floresta, e a luz do sol
iluminava cada árvore e pedra do lugar.
Ratie achava que estava
fundo nas profundezas da terra, mas acabara chegando a um belo lugar cheio de
luz e verde.
- Ei! Quem é você?
Quem falara fora uma
criatura linda, alta, pelos brancos que brilhavam como uma estrela. Um cavalo
com um chifre no centro da cabeça.
- Meu nome é Ratie.
Acho que estou perdido.
- Deve estar mesmo! Nunca
o vi por aqui. Veja o que fez com o nosso lago! Seu pelo o sujou!
Para Ratie a água ainda
estava tão limpa quanto poderia estar.
- Como chegou aqui? – o
unicórnio perguntou.
- Segui a borboleta
pelo poço.
- Você não pertence a
este lugar! Todos têm uma função importante! Eu, por exemplo, deixo puro e saudável
tudo o que toco com meu chifre! Não há lugar para criaturas como você por aqui!
Estes são tempos perigosos, os homens têm aparecido ultimamente.
De novo a rejeição. O
Poço Profundo deveria ser o lugar onde não seria mais mal tratado e mal
compreendido. Correu, então, para
longe.
Logo depois um esquilo,
lá do alto de sua árvore, guinchou:
- Quem é você? O que
faz aqui?
- Sou Ratie e cheguei
pelo poço.
- Mas o que você faz?
Eu, por exemplo, planto.
- Eu também posso plantar!
- Nós esquilos já
fazemos isso. Acho melhor você voltar, não tem lugar pra você aqui.
Será que ninguém jamais
gostaria dele? Decidiu, então, que ia embora da floresta.
Em outra árvore Ratie
viu uma coruja. Aquela era uma coruja adulta e se Ratie vacilasse ela o
abocanharia de uma só vez! Mas não foi o que ela fez.
- Está perdido?
- Preciso sair da
floresta. Não tenho função aqui. Mas não quero voltar aos esgotos!
- Todos têm função,
você só precisa descobrir a sua. Isso faz parte da vida na floresta.
- Mas o unicórnio e o
esquilo disseram que não tem lugar para mim aqui. – disse Ratie.
- Isso também faz parte
da vida na floresta, mas você tem que fazer a sua parte. – disse a coruja e saiu voando.
Foi quando de repente
um barulho muito alto ecoou. E todos os animais começaram a correr assustados.
- O que está
acontecendo? – perguntou Ratie.
- O homem está na
floresta de novo! Está caçando! – gritou um coelho.
Ratie saiu correndo e
rapidamente encontrou um lugar para se esconder, debaixo de uma raiz.
- É isso! - Ratie percebeu.
Ratie sabia viver sem
ser percebido. Podia se esconder em cada sombra, cada rachadura. E sabia usar o
ambiente onde estava para se esconder. Gritou para chamar os animais da
floresta, desesperados com o barulho assustador dos homens.
Ratie explicou que
sabia como salvá-los. E foi o que fez! Ajudou o unicórnio a se esconder perto
das árvores de casca clara e galhos nus, e a ficar bem quietinho. Sem fugir!
Ajudou o esquilo a se esticar nas árvores de casca da mesma cor que ele, bem
quietinho e sem fugir! E desse jeito todos os outros animais se esconderam com
a ajuda de Ratie.
No dia seguinte todos
estavam sãos e salvos e felizes, e Ratie era o herói da floresta. Sentiu-se
feliz e aceito como nunca, pois percebera que tinha uma função, que servia pra
alguma coisa e que todos são especiais ao seu modo, só que cabe a cada um
descobrir por si mesmo o porquê.
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